Expedição refaz viagens de d. Pedro 1º a MG e SP antes da Independência

Em obras para conter infiltrações, cripta com restos mortais de d. Pedro 1º segue fechada

Expedição refaz viagens de d. Pedro 1º a MG e SP antes da Independência
Expedição refaz viagens de d. Pedro 1º a MG e SP antes da Independência

Leonardo Augusto - Belo Horizonte, Mg (folhapress) - 11/09/2023 11:26:54 | Foto: Rio de Janeiro (RJ) - Expedição refaz passos de Dom Pedro I até a proclamação da Independência. Foto: Divulgação - Divulgação

O grito de independência de dom Pedro 1º, que nesta quinta (7) completa 201 anos, foi precedido de viagens do então regente a duas das principais províncias do Brasil à época, Minas Gerais e São Paulo, com o objetivo de avaliar o ambiente político interno para a possível separação de Portugal.

Com partidas do Rio de Janeiro, uma das viagens foi feita a Ouro Preto (MG), então Vila Rica, entre março e abril de 1822. A outra, a Santos (SP), entre agosto e setembro do mesmo ano. Na volta da cidade do litoral paulista, dom Pedro proclamou a Independência às margens do riacho Ipiranga, em São Paulo.

O motivo das viagens era a realização de reuniões com lideranças locais para avaliar a emancipação, ideia que já vinha crescendo em meio à elite brasileira na época.

Os dois trajetos foram repetidos em 2023 por uma expedição que teve encerramento nesta quarta (6) em São Paulo.

Com estradas de terra ou pavimento rústico substituídas por asfalto, e trocando cavalos e mulas por automóveis, a expedição esteve em cidades como São João del Rei e Barbacena, em Minas Gerais, e Bananal e Aparecida, em São Paulo. Ao todo foram cinco cidades mineiras e 13 paulistas.

A expedição foi realizada pela Federação das Câmaras Portuguesas de Comércio no Brasil e faz parte das comemorações pelos 200 anos da Independência do Brasil dentro do projeto "Heróis Portugueses do Brasil".

O momento mais tenso da viagem de dom Pedro 1º à província de Minas Gerais ocorreu em Vila Rica. O regente teve que esperar por vários dias nas imediações da cidade, aguardando o retorno de emissários encarregados de anunciar a sua chegada.

A ida à cidade ocorreu cerca de dois meses depois do Dia do Fico, em 9 de janeiro de 1822, quando dom Pedro, pressionado pela corte a retornar a Portugal, anunciou que ficaria no Brasil.

"Tendo resolvido permanecer no Brasil e não retornar a Portugal, conforme as ordens que havia recebido das cortes de Lisboa, o príncipe regente decidiu visitar Minas Gerais, que era a província mais populosa e mais rica, a fim de sentir a opinião pública e o clima político das Minas Gerais", conta o prefeito de Ouro Preto, Ângelo Oswaldo (PV).

"Havia a possibilidade de uma reação hostil à presença do príncipe regente, que era tido como um independentista", acrescenta. Dom Pedro, no entanto, entrou na cidade e foi bem recebido.

Antes, d. Pedro 1º e sua comitiva já haviam ficado cinco dias em São João del Rei, em reuniões para que não faltassem apoio para a entrada em Ouro Preto, segundo Vittorio Lanari, coordenador da expedição pelos lugares em que o então regente esteve antes da proclamação da Independência. "O objetivo era abafar possíveis rebeliões", afirma.

A preocupação com revoltas dominou também a viagem de dom Pedro a Santos. A primeira localidade em que esteve na província de São Paulo foi a hoje cidade de Bananal.

O regente dormiu na Fazenda Três Barras, que pertencia ao capitão Hilário Gomes Nogueira, um dos maiores proprietários de terras na região à época. Em seguida foi para São José do Barreiro, onde almoçou na fazenda Pau d'Alho, que também pertencia a um militar, o coronel João Ferreira de Souza.

O grupo organizador das viagens pelos locais onde passou dom Pedro documentou todo o roteiro. Um registro em audiovisual será produzido. O grupo, nas passagens pelos locais, fez palestras e distribuiu livros didáticos.

Houve espaço também para agenda religiosa do regente na viagem a Santos. Uma das paradas foi em Aparecida, onde visitou a capela da santa que dá nome à cidade, a quem pediu bênçãos.

A viagem de ida do regente à província de São Paulo teve como destino final Santos, terra natal de José Bonifácio de Andrade e Silva, conhecido como o "Patriarca da Independência", por ser um incentivador do movimento.

O projeto "Heróis Portugueses do Brasil" já teve duas expedições. Uma sobre a história de Pedro Teixeira, que desbravou a Amazônia, e Martim Soares Moreno, que lutou contra franceses e holandeses no nordeste.

Em obras para conter infiltrações, cripta com restos mortais de d. Pedro 1º segue fechada

GIULIANA MIRANDA - LISBOA, PORTUGAL (FOLHAPRESS)

Um dos principais nomes ligados à pesquisa da família imperial brasileira, a arqueóloga e historiadora Valdirene Ambiel afirma que a cripta construída na cidade de São Paulo para abrigar os restos mortais da realeza tem sido historicamente negligenciada. Problemas como umidade, infiltrações e vazamentos se acumulam e, atualmente, o espaço se encontra fechado para a visitação.

"A cripta recebeu uma espécie de maquiagem para o bicentenário da Independência", diz a pesquisadora.

Segundo ela, em 21 de outubro de 2022, menos de dois meses depois da efeméride, os problemas estruturais já estavam visíveis. "Era uma tristeza. Fiz uma visita ao espaço e verifiquei que já havia um balde para conter a água de uma goteira."
Estão sepultados no local dom Pedro 1º (1798-1834) e as imperatrizes d. Leopoldina (1797-1826) e d. Amélia (1812-1873). Segundo Ambiel, que dedicou seu mestrado e doutorado na USP à análise dos restos mortais da família, as condições degradadas ameaçam a preservação dos remanescentes humanos.

"Há muitas questões estruturais no monumento da Independência. Eles não começaram agora, eles vêm desde as décadas de 1970 e 1980. Ainda criança, eu costumava visitá-lo com o meu pai e me deparava com a cripta muitas vezes interditada, normalmente por infiltrações."
A arqueóloga destaca que o local onde a cripta foi construída, uma área de aterro do rio, dificulta a manutenção e, justamente por isso, requer cuidados especiais de conservação.

Localizada no parque da Independência, na zona sul paulistana, a cripta é de responsabilidade da prefeitura, com gestão vinculada à Secretária Municipal de Cultura.

O site oficial da cripta limita-se a informar que o espaço está "temporariamente fechado", sem outras explicações ou previsão de reabertura. Na porta de entrada do monumento, uma folha de papel A4 escrita à mão diz "fechado para reforma".

Em nota, a gestão Ricardo Nunes (MDB) diz que o cronograma das obras foi ajustado, mas que restam detalhes finais de acabamento e instalação de novas luminárias. A previsão, acrescenta a prefeitura, é que tudo esteja pronto no início de outubro.

Entre as mudanças em curso no local estão a instalação de sanitários e rampas acessíveis e a correção dos problemas de infiltração.

O mausoléu fica embaixo do monumento à Independência, que reúne estátuas das principais figuras ligadas à emancipação brasileira, e começou a ser construído em 1952.

Os restos mortais da primeira imperatriz brasileira, Maria Leopoldina, foram os primeiros a chegar, transportados do Rio de Janeiro em 1954, no âmbito das comemorações do quarto centenário da cidade de São Paulo.

Provenientes de Portugal, os despojos de Pedro 1º foram transferidos para a cripta em 1972, em um evento que foi transformado em propaganda pela ditadura militar brasileira.

Os restos mortais de d. Amélia, que estavam sepultados em Lisboa, foram incorporados em 1982. Devido às pequenas dimensões da cripta, a segunda imperatriz brasileira acabou sendo acomodada, literalmente, em um espaço dentro da parede.

"A cripta foi feita para os remanescentes humanos de d. Pedro 1 e de d. Leopoldina, não de d. Amélia", diz a pesquisadora, que destaca a falta de contexto histórico para a presença da segunda imperatriz no monumento. "Ela tinha dez anos em 1822 e não tinha ligação com a independência do Brasil, portanto, não deveria estar na cripta. As autoridades municipais tiveram que 'improvisar' um espaço para ela."
Pedro 1º e Leopoldina, por sua vez, têm seus sarcófagos expostos em destaque.

Segundo Ambiel, a atual localização dos restos mortais de d. Amélia, ainda mais sujeito à umidade do que o dos demais, representa um risco à conservação.

A prefeitura, porém, afirma que já houve a troca do sistema de ar condicionado, o que "já está garantindo melhores e mais estáveis condições de temperatura no espaço para a preservação dos despojos de Amélia".

Na época em que realizou sua dissertação de mestrado, defendida em 2013, a pesquisadora teve autorização para exumar os vestígios da família e tornou-se a primeira cientista a conduzir um estudo detalhado do conjunto.

O trabalho teve grande repercussão por causa de várias revelações, entre as quais a ausência de fratura no fêmur de d. Leopoldina. Alguns historiadores afirmavam até então, apesar da falta de documentação, que a austríaca teria morrido por complicações após ter sido empurrada de uma escadaria por dom Pedro.

"Na época da exumação, felizmente encontramos os vestígios de dona Amélia em boas condições, mas isso é, muito provavelmente, resultado do trabalho feito pelas equipes de Portugal e do Brasil quando o corpo foi transferido", analisa.

Após a exumação, a equipe de Ambiel fez um novo procedimento de embalsamamento em Amélia. Os custos dos materiais utilizados ficaram a cargo do Serviço de Verificação de Óbitos da Capital, que pertence à USP.

A pesquisadora afirma que chegou a pagar com recursos próprios —além de ter recolhido doações com a família e com professores da USP— por obras de restauro e conservação no espaço dedicado à d. Amélia na cripta.

As notas fiscais, reunidas em um caderno com dezenas de páginas de anotações minuciosas, mostram que os recursos foram investidos em diversos itens, incluindo mármores e cimento.

"Até a máquina para medir a umidade fui eu que comprei", diz Ambiel, que se voluntariou para fazer semanalmente, e sem custos para a prefeitura, a avaliação do estado de conservação da imperatriz.

"Eu ia toda segunda-feira de manhã, que é quando a cripta estava fechada", explica. "Teve dia de Natal que eu amanheci do lado da d. Amélia, feriados prolongados, tudo."
Segundo Ambiel, sem aviso prévio, em fevereiro de 2018 —na administração de João Doria, então no PSDB—, ela passou a ser impedida de realizar o monitoramento.

Na comunidade acadêmica, o posicionamento da pesquisadora, que reclamava das condições precárias e cobrava publicamente melhorias no espaço, é apontado como uma das motivações para a irritação de políticos.

"O que motivou o meu trabalho foi uma preocupação com os remanescentes humanos dos primeiros imperadores do Brasil para as gerações futuras. Sempre fiz o possível para tentar preservá-los", conta.

A pesquisadora cobra mais transparência nos gastos públicos, nas obras e na gestão do espaço.

"O 7 de setembro é uma data importantíssima para entender o país chamado Brasil e o povo brasileiro", afirma. "Os restos mortais da família imperial merecem mais respeito."

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