Redução de escala 6x1 esbarra em informalidade alta e produtividade baixa
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Redução de escala 6x1 esbarra em informalidade alta e produtividade baixa
Daniele Madureira, São Paulo, Sp (folhapress) - 18/11/2024 07:05:02 | Foto: Agência Brasil
A PEC (Proposta de Emenda à Constituição) de autoria da deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP) prevê a abolição da escala de seis dias trabalhados por um de folga (6x1) e já ultrapassou o mínimo de assinaturas necessário para ser protocolada e começar a tramitar na Câmara dos Deputados.
A discussão a respeito da redução da carga horária trabalhada no Brasil, com a manutenção dos salários, ganhou repercussão nas redes sociais, entre parlamentares, autoridades e entidades patronais e da sociedade civil. Nesta quinta (15), foram realizadas manifestações a favor da PEC em diversas capitais do país, como São Paulo, Rio, Brasília, Belo Horizonte e Porto Alegre.
"É um texto que vai trazer dignidade e qualidade de vida aos trabalhadores brasileiros", disse Erika Hilton, durante entrevista coletiva depois de obter a quantidade de assinaturas exigida para a tramitação.
Alguns economistas defendem até uma semana de quatro e não cinco dias de trabalho -essa última foi implementada pelo empresário Henry Ford, nos anos 20 do século passado. "A verdade é que há muito valor econômico no tempo de lazer", diz o economista português Pedro Gomes, professor de economia da Universidade de Londres.
Existem, no entanto, posições contrárias à PEC, especialmente por parte de entidades patronais. Na opinião de boa parte dos empresários, a redução da escala vai exigir contratação de mão de obra extra, o que aumentaria os custos, que poderão ser repassados para o consumidor. Ou então uma escala reduzida pode levar as empresas a reduzirem os postos de trabalho, aumentando a carga de quem continua empregado.
Confira, a seguir, algumas opiniões a respeito da PEC:
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CONTRA O FIM DA ESCALA 6X1
Alexandre Furlan, presidente do Conselho de Relações do Trabalho da CNI (Confederação Nacional da Indústria): "A melhor via para estabelecer jornadas de trabalho é a negociação"
Antonio Carlos Vilela, vice-presidente da Firjan (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro): "No cenário atual, a redução da jornada é um risco ao crescimento do nosso país"
José Roberto Tadros, presidente da CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo): "Aumento inevitável na folha de pagamento pressionará ainda mais o setor produtivo e pode resultar na necessidade de reduzir o quadro de funcionários"
Josué Gomes, presidente Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo): "Redução de jornada de trabalho deve ocorrer por negociações coletivas"
Luciano Hang, dono da rede de lojas Havan: "Brasileiro não quer trabalhar menos"
Nikolas Ferreira, deputado federal PL-MG: "O projeto é terrivelmente elaborado"
Paulo Solmucci Júnior, presidente da Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes): "Não vejo chance de uma ideia estapafúrdia dessa prosperar"
Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central do Brasil: "Vai aumentar o custo do trabalho e elevar a informalidade"
Sergio Mena, presidente da Abrafarma (Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias): "Também adoraria trabalhar menos tempo. Mas como entregar resultado e atender o público num setor como o nosso?"
Silas Malafaia, pastor, líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo: "Pode se levar a sério alguma coisa que vem do PSOL?"
Sóstenes Cavalcante, deputado federal PL-RJ: "Este é um tiro de morte no coração da economia"
A FAVOR DO FIM DA ESCALA 6X1
Cleitinho Azevedo, deputado federal Republicanos-MG: "Meu pai trabalhou [na escala] 7x0. Teve que morrer para descansar"
Geraldo Alckmin, vice-presidente do Brasil: "É uma tendência à medida que a tecnologia avança e você pode fazer mais com menos pessoas"
Henrique Vieira, deputado federal PSOL-RJ: "A jornada 6x1 é exaustiva, degradante, precariza a vida do trabalhador"
Luiz Marinho, ministro do Trabalho e Emprego: "A jornada 6x1 é cruel"
Marcelo Crivella, deputado federal Republicanos-RJ: "Espero que as pessoas tenham mais tempo de ir à igreja e se dedicar a causas sociais"
Pedro Gomes, professor de economia da Universidade de Londres: "A semana de quatro dias é a melhor forma de organizar a economia no século 21"
Rick Azevedo, vereador eleito pelo PSOL-RJ e fundador do movimento VAT (Pela Vida Além do Trabalho): "Escala 6x1 é uma escravidão moderna, incompatível com a dignidade do trabalhador"
Tabata Amaral, deputada federal PSB-SP: "Precisamos pensar em incentivos para as pequenas empresas contratarem"
Redução de escala 6x1 esbarra em informalidade alta e produtividade baixa
DOUGLAS GAVRAS, GUSTAVO GONÇALVES E GUSTAVO SOARES, SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - "No serviço, eu ficava o tempo todo de pé e não conseguia descansar no dia de folga. Agora, sofro com dores", diz a paulistana Edna Prazeres, 56, que trabalha há 17 anos em uma lanchonete na escala 6x1 (seis dias de trabalho e um de descanso semanal) e está afastada por questões de saúde.
Moradora da zona leste, ela pega dois ônibus para chegar ao trabalho. A jornada com dois dias de descanso é um sonho para a balconista. "Perdi aniversários de amigos, datas importantes com a família. Passar o Dia das Mães com as minhas filhas foi só uma vez e nunca mais."
O debate sobre a escala 6x1 ganhou força com uma PEC (proposta de emenda constitucional) da deputada Erika Hilton (PSOL-SP). A proposta é a adoção de uma jornada de 36 horas semanais, dividida em quatro dias.
A redução da jornada de trabalho ganhou espaço em vários países, mas, no Brasil, ainda esbarra em questões como a dificuldade que o país tem em reduzir a informalidade e aumentar a produtividade de seus trabalhadores, de acordo com especialistas ouvidos pela reportagem.
"Já tivemos uma experiência de mudança de 48 para 44 horas na Constituição de 1988 que não foi positiva", destaca Fernando de Holanda, do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas).
Segundo o pesquisador, apenas alterar a alocação das horas ao longo da semana pode funcionar, mas a redução de jornada, conforme está sendo discutida, é inviável. "E o principal problema é tornar obrigatório algo que empresas hoje já negociam caso a caso".
Renan Pieri, professor de economia da FGV EAESP (Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas), ressalta que dos trabalhadores formais que trabalham mais de 36 horas semanais, 26% trabalham no comércio e 19% trabalham em atividades financeiras, imobiliárias, profissionais e administrativas.
"A maioria desses empregos está em pequenas e médias empresas com margem de lucro apertada. É uma política que pode parecer que vai beneficiar todos os trabalhadores, mas só vai abranger um grupo muito restrito, que são os trabalhadores de carteira assinada."
No trimestre encerrado em setembro, a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) Contínua registrou que a taxa de informalidade foi de 38,8% da população ocupada (ou 40 milhões de trabalhadores informais) ante 38,6 % no trimestre encerrado em junho e 39,1 % no mesmo trimestre de 2023, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Ao mesmo tempo, o Brasil é um dos países do G20 com a maior média de horas semanais trabalhadas, segundo dados da OIT (Organização Internacional do Trabalho) -acima de Japão, Coreia do Sul e Estados Unidos, por exemplo.
Para Jorge Soutomaior, professor da Faculdade de Direito da USP e ex-juiz titular na 3ª Vara do Trabalho de Jundiaí, não só é viável como necessário adotar essa adaptação no mercado de trabalho brasileiro.
Segundo o ex-juiz, o limite de 44 horas semanais foi estabelecido em uma época com um padrão produtivo diferente e, mesmo na época, representou uma mudança modesta.
"Queremos realmente pessoas que vendem sua força de trabalho praticamente o dia inteiro, sem tempo para ler, escrever, estudar, participar de debates políticos e econômicos ou se envolver nas atividades de cuidado familiar?", questiona.
A demanda por uma aproximar a jornada de trabalho no Brasil ainda compete, na visão dos analistas, com a produtividade do trabalhador brasileiro em comparação a seus pares internacionais.
Um relatório da OIT aponta que, no período de 2015 a 2023, a produtividade do trabalho no Brasil ficou praticamente estagnada (com alta de 0,1% ao ano).
Enquanto isso, países com uma média semanal de horas trabalhadas por pessoa menor que o Brasil tiveram ganhos de produtividade no mesmo período. No Canadá, o aumento foi de 0,4% ao ano; nos Estados Unidos, de 1% ao ano.
Para a organização, vários fatores estão na base do renitente baixo crescimento da produtividade no Brasil, incluindo regimes regulatórios, falta de investimento em infraestrutura e sistemas tributários anacrônicos.
Para Daniel Duque, especialista em mercado de trabalho do FGV Ibre, a produtividade do trabalho é um fator que não pode ser desconsiderado na discussão. "O Brasil tem uma carga horária até menor do que seria esperado, dado o seu nível de desenvolvimento e produtividade."
Segundo ele, a mudança na escala poderia levar a uma redução do PIB (Produto Interno Bruto) entre 2% e 3,3% no caso de uma jornada de 40 horas semanais e de 6,8% a 8,1% para uma jornada de 36 horas semanais.
Pelo mais recente Ranking Mundial de Competitividade do IMD (Institute for Management Development), que além do PIB e da produtividade considera questões políticas e sociais, o Brasil ficou em 62º lugar (duas posições abaixo da lista anterior) entre 67 economias analisadas.
Houve melhora no desempenho econômico, mas queda em eficiência do governo e nos negócios. Singapura, Suíça e Dinamarca ocupam as melhores colocações. Na região, ficaram em posições acima Chile, México e Colômbia.
Hélio Zylberstajn, professor sênior da faculdade de economia da USP e coordenador do Salariômetro (Fipe), avalia que, para que a produtividade cresça são necessários investimentos em inovação tecnológica e qualificação da mão de obra.
"A redução da jornada por meio de uma PEC não aumentará a produtividade, por não alterar nem a tecnologia usada na produção e nem a qualificação dos trabalhadores", avalia o professor.
"O impacto será imediato no custo do trabalho que, se for repassado aos preços, causará inflação e se não for absorvido pelas empresas, causará demissões. O caminho não é esse."
Ele acrescenta que o setor informal é sempre de baixa produtividade e que o país deve se concentrar em crescer de forma sustentada para, entre outras coisas, absorver esses trabalhadores no setor formal.
Comentários para "De Campos Neto a Crivella, saiba quem é contra e quem é a favor do fim da escala 6x1":