Biomas brasileiros: o que são e suas características
Estadão Conteúdo - 14/10/2020 07:42:42 | Foto: Greenpeace Brasil
Biomas brasileiros: o que são e suas características
Amazônia, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica, Pampas e Pantanal são os seis biomas encontrados no Brasil. Entenda quais são as suas particularidades
Nos últimos anos, a devastação dos biomas do Brasil tem chamado atenção para a discussão ambiental. Somente em 2020, houve um aumento de 38% nos focos de incêndio na Amazônia e 106% no Pantanal, segundo dados do Greenpeace Brasil. Os riscos do desmatamento são muitos; há interferência na regulação das chuvas e do clima. A recuperação dos danos pode ser lenta, cerca de 50 anos no caso do Pantanal. Em relação à Amazônia, Rômulo Batista, porta-voz do Greenpeace Brasil, explica que se a destruição se mantiver na intensidade que está atualmente, o bioma pode perder a capacidade de se regenerar. Para te ajudar a compreender a gravidade dos últimos acontecimentos, o Estadão preparou esta reportagem, que explica o que são biomas e quais existem em nosso território.
O IBGE define “Biomas” como “grande conjunto de vida vegetal e animal caracterizado pelo tipo de vegetação dominante”. Mariana Napolitano, gerente de Ciências do WWF-Brasil , explica que a classificação de cada bioma é realizada “de acordo com clima, formações vegetais, solo, altitude, entre outros elementos que caracterizam os diversos ambientes continentais”.
É importante ressaltar que “bioma” não é sinônimo de “ecossistema”: a classificação leva em conta não apenas as interações que ocorrem na localidade, mas também o meio físico. Ou seja, considera-se fatores como o tipo de vegetação que são recorrentes, assim como aspectos geológicos e a dimensão da área. Um ecossistema só é identificado como “bioma” se ele tiver abrangência de grande escala. De acordo com o IBGE , o território brasileiro abriga seis biomas: Amazônia, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica, Pampa e Pantanal.
Como pode ser observado no mapa, o mais extenso deles é a Amazônia . Ela ocupa cerca de 49% do nosso território e se espalha por toda a extensão dos Estados do Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia e Roraima e, ainda, invade parte do Tocantins, Mato Grosso e Maranhão. Típica floresta tropical úmida, a Amazônia abarca aproximadamente 20% da disponibilidade mundial de água doce e grandes reservas minerais. Pela proximidade da Linha do Equador, ela se posiciona em uma região de grande incidência solar, o que lhe garante muito calor e energia. Segundo o porta-voz do Greenpeace Brasil , Rômulo Batista, o calor somado à umidade “é sinônimo de explosão de vida”.
Batista explica que essas condições propiciam que a região seja muito rica em biodiversidade. O solo é fertilizado pelas chuvas e, em alguns locais, pela inundação dos rios, o que permite que o solo seja rico em matéria orgânica. Essas condições da composição natural do bioma permitem que ele seja biogeograficamente heterogêneo, ou seja, a paisagem é diversa. “Dentro da Amazônia temos várias fitofisionomias, tipos diferentes de vida, grupos de animais ou composição vegetal”.
A diversidade é tanta que até hoje são encontradas espécies que ainda não foram catalogadas pela humanidade. “Somente nos últimos quatro anos descobrimos mais de 600 espécies, entre animais e plantas, que não conhecíamos”, relata Batista. “Os rios amazônicos também têm muita biodiversidade. O boto-vermelho, por exemplo, é um mamífero fluvial restrito da Amazônia”.
Essa riqueza, porém, está em ameaça. De acordo com dados do MapBiomas, uma iniciativa do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Observatório do Clima (SEEG/OC), o território de floresta natural no bioma reduziu de 379,7 milhões de hectares, em 1985, e para 336,1 milhões de hectares no ano passado, o que representa uma redução de 11,4%.
Neste ano, a devastação permanece a todo vapor. Segundo informações do INPE, as queimadas na Amazônia aumentaram 19% de 1º de janeiro a 8 de outubro de 2020, quando comparado com o mesmo período do ano passado. Em relação ao mês, foram registrados 19,9 mil queimadas no mês de setembro em 2019, em 2020 foram 32 mil, ou seja, houve um crescimento de 60,6%. “O desmatamento e as queimadas são dois lados de uma mesma moeda, elas [queimadas] podem representar o final do desmatamento ou a ferramenta para o desmatamento”, explica Rômulo Batista.
Cobrindo cerca de 10% do País, a Caatinga é cercada pelo Cerrado e Mata Atlântica, por isso, restringe-se apenas por parte dos estados da Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará, Piauí e Minas Gerais. O seu nome tem origem no tupi-guarani e significa “mata branca”. No entanto, apesar do que a sua alcunha pode insinuar, esse bioma tem relativa biodiversidade de flora e fauna, tendo, inclusive, muitas espécies que só ocorrem neste bioma. Segundo o Instituto Sociedade, População e Natureza, aproximadamente mil espécies vegetais, das quais 318 endêmicas, habitam a região. Além disso, cerca de 1.307 animais vivem por lá, entre eles, 327 são exclusivos do bioma.
É da Caatinga que vêm árvores como o cajueiro e a aroeira. É de lá também frutos como o jenipapo e o umbu. O “sapo-cururu”, da cantiga infantil, é um dos animais que vivem nessa região; além dele, lá se encontra o tatu-bola, a onça-parda e a jaguatirica. A famosa asa-branca, da canção de Luiz Gonzaga, também é uma espécie comum do bioma. Mas as verdadeiras raridades são encontradas entre os animais invertebrados. Somente entre as abelhas, são mais de 180 espécies, das quais algumas são endêmicas, como a jandaíra, típica do Ceará e Rio Grande do Norte. O inseto, que pode parecer diminuto e insignificante, é muito importante para a polinização e produz um mel muito utilizado, não só para alimentação, mas também com fins medicinais.
Estima-se, porém, que a presença humana na região já tenha dizimado com cerca de 36% da vegetação original desde o início da povoação da região. De acordo com o MapBiomas, em 1985 as florestas naturais da Caatinga ocupavam 56,3 milhões de hectares. No ano passado, elas estavam presentes e 50,1 milhões de hectares, uma perda de 10,89% de sua área em 34 anos.
Com a segunda maior área, o Cerrado ocupa 24% do território brasileiro e se estende por mais de 2 milhões de km2, indo do Paraná até o Maranhão, passando por toda a região do Planalto Central. Esse bioma é considerado a savana mais rica em biodiversidade do mundo. Segundo dados do IBGE, são aproximadamente 10 mil espécies de vegetais, além de 837 espécies de aves, 161 mamíferos, das quais 19 são endêmicas, 150 anfíbios e 120 répteis.
O clima com duas estações bem definidas, verão chuvoso e inverno seco, molda a paisagem do Cerrado. A sua composição vegetal é múltipla, podendo ser encontradas regiões de florestas com árvores de até 20m de altura, mas também locais marcados pela presença dos campos limpos, caracterizado por plantas lenhosas de pequeno porte e gramíneas. O tipo mais presente, recobrindo cerca de 20% do bioma, são as chamadas savanas arborizadas, com árvores e arbustos esparsos, sobre um tapete graminoso.
Os longos períodos de seca condicionaram a vegetação do Cerrado a se adaptar de formas muito peculiares, sendo característico das plantas locais as raízes profundas, assim como os troncos retorcidos e o formato das folhagens, que evitam a perda excessiva de água. Estima-se que aproximadamente 4 mil espécies vegetais sejam exclusivas desse bioma, segundo o Instituto Sociedade, População e Natureza. As queimadas naturais, que ocorrem no inverno, também proporcionam um show impressionante na região. Parte da vegetação é estimulada pelo fogo a florescer, essa é uma característica evolutiva dessas espécies, que lhes permite uma recuperação rápida dos incêndios naturais.
O Cerrado também é rico em plantas medicinais e que tem uso para alimentação. De acordo com o Instituto Sociedade, População e Natureza, são 220 espécies, que podem ser utilizadas com esse fim. As mais famosas são o pequi, muito utilizado no preparo do arroz em Goiás e triângulo mineiro, o babaçu, jatobá e a gueroba. A sua fauna também é muito rica, além do famoso lobo-guará , encontra-se na região animais que são considerados retratos do Brasil como o carcará, tucano, arara, tamanduá-bandeira, catitu, paca e o macaco-prego. Lá também vive o pato-mergulhão, uma espécie rara e endêmica da América do Sul, que está seriamente ameaçado de extinção.
A sua vegetação natural, contudo, tem sido dilacerada, se em 1985 ela ocupava uma área de 114,7 milhões de hectares, em 2019 essa área era de 89,1 milhões de hectares, uma perda de 22,2%. “A partir da década de 90 e anos 2000, as taxas de desmatamento do Cerrado e Amazônia se elevaram acentuadamente, sendo que hoje esses biomas já perderam cerca de 50% e 18% e sua cobertura original. Ao longo de vários anos, o Brasil liderou a perda de florestas no mundo”, diz Marina Napolitano, gerente de Ciências do WWF-Brasil.
A região correspondente à localização da Mata Atlântica representa aproximadamente 13% do País. Como o nome sugere, o bioma deveria cobrir boa parte da faixa litorânea brasileira, se estendendo desde o Rio Grande do Sul até o Rio Grande do Norte. O seu posicionamento geográfico coincide com a área mais povoada do Brasil; o IBGE estima que mais de 50% da população esteja concentrada nessa localidade. A presença humana, no entanto, compromete a sua sobrevivência. Assim como o Cerrado, a Mata Atlântica é considerada um hotspot.
Típica floresta tropical, quente e úmida, a Mata Atlântica era formada majoritariamente por florestas densas e de árvores frondosas, conhecidas como “florestas sempre-verde”. Atualmente, a sua maior composição é de florestas estacionais semidecidual, caracterizadas por uma vegetação de porte pequeno-médio e com sazonalidade marcada, como é observado no Cerrado.
Semelhante à Amazônia, o calor e a umidade lhe garantem enorme riqueza nas formas de vida. De acordo com o IBGE, há cerca de 1.361 espécies de animais,das quais 567 são endêmicas, que vivem na área compreendida pelo bioma. O mico-leão-dourado, típico do Estado do Rio, e o mico-leão-da-cara-preta, exclusivo de regiões do Paraná e de Santa Catarina. Além deles, também é possível encontrar outros animais como a onça-pintada, anta, gaviões, beija-flores e papagaios.
Em relação à flora, Marina Napolitano, gerente de Ciências do WWF-Brasil, destaca que o bioma tem uma “diversidade vegetal maior que a diversidade da América do Norte e da Europa”. A ONG S.O.S Mata Atlântica estima que mais de 20 mil espécies componham as paisagens da região, sendo que cerca de 7 mil são próprias do bioma; o pau-brasil é uma dessas espécies. A bromélia-imperial, jequitibá, pitanga e cajá são outras plantas que podem ser encontradas nesse bioma.
A Mata Atlântica, por sua vez, é que teve a maior parte da vegetação original dizimada. “A Mata Atlântica já perdeu mais de 87% de sua vegetação desde 1.500, mais acentuadamente no último século”, explica Napolitano. “Isso já levou pelo menos duas espécies de anfíbios à extinção e deixou outras 46 espécies ameaçadas”.
Presente em apenas 2% do território, o Pampa é encontrado só no Rio Grande do Sul, mais precisamente nas regiões do Planalto da Campanha, Depressão Central, Planalto Sul-Rio-Grandense e Planície Costeira. Fora do Brasil, ele ainda se espalha pelos territórios do Uruguai e da Argentina. Esse bioma faz divisa apenas com a Mata Atlântica e o seu clima é chuvoso, não havendo período de estiagem, mas com temperaturas muito baixas durante o inverno, e o relevo é marcado pelas coxilhas. O solo é muito fértil, de “terra roxa”, o que acaba sendo um grande atrativo para atividades de agricultura.
Tais características são definidoras para a vegetação, que é predominantemente de estepe, ou seja, composição espaçada de árvores e arbustos baixos e predomínio de gramíneas. As principais plantas do bioma são as araucárias, turfeiras, tapes de capim-caninha, capim-forquilha, roseta, alecrim-do-campo e barbas-de-bode.
Já a fauna é composta por animais típicos de regiões campestres como a ema, perdiz (codorna), quero-quero, caturrita, zorrilho, macuquinho-da-várzea, graxaim-do-campo, furão, tatu-mulita, cervo-do-pantanal, picapauzinho-chorão e veado-campeiro. Segundo o site Invivo, da Fiocruz, 102 espécies de mamíferos, 476 de aves e 50 de peixes foram identificadas no bioma.
Também presente em 2% território nacional, o Pantanal está circunscrito nos territórios do Mato Grosso e Mato grosso do Sul. No entanto, ele não se restringe às nossas fronteiras, ao norte do Paraguai e leste da Bolívia também é possível encontrar áreas ocupadas por esse bioma. Devido à sua grande biodiversidade, o bioma é considerado Patrimônio Natural Mundial pela Unesco. O clima tem duas estações bem marcadas: verão quente e chuvoso e inverno seco. O relevo marcado por grandes extensões de planícies e muita presença de rios contribui para que esse seja um bioma marcado por terras alagadas.
Ao contrário dos Pampas, o solo pantaneiro não é considerado fértil. Por serem terrenos inundados por longos períodos do ano, a decomposição da matéria orgânica é lenta. Nas localidades mais altas e secas, o solo é ácido e arenoso. A vegetação predominante é típica de paisagens de estepe, mas é possível se deparar com espécies de plantas presentes na região amazônica e do cerrado. Nas margens dos rios e em regiões alagadiças são encontradas espécies como aguapé, a erva-de-santa-luzia, o buriti, a sagitária, o pau-de-formiga, a cabomba e a utriculária.
Na região são encontradas 122 espécies de mamíferos, 93 de répteis, 656 de aves e 263 de peixes. Estes últimos são tantos que superam o número de todas as espécies catalogadas em todos os rios da Europa. Assim como a vegetação, a fauna também é marcada por grande diversidade, sendo possível encontrar muitos animais que também estão presentes em outros biomas brasileiros. Os mais famosos são a capivara, a ariranha, o tuiuiú, macaco-prego, pacu, dourado e o pintado.
Por lá, a cobertura vegetal natural perdeu 24% de seu território de 1985 a 2019, segundo o MapBiomas. No primeiro ano da série histórica, a vegetação original ocupava 5,7 milhões de hectares, no último ano esse espaço foi reduzido a 4,3 milhões de hectares. A devastação no bioma continua alta em 2020, de acordo com dados do INPE, foram registrados 8,1 mil focos de incêndio em setembro deste ano, frente a 2,8 mil em 2019, um crescimento de 64,3%. Em relação ao período de 1º de janeiro a 8 de outubro, os registros de incêndio aumentaram 215% em 2020, comparado a 2019. Os efeitos dessa destruição já são visíveis, Rômulo Batista, porta-voz do Greenpeace, diz que isso já resulta em um déficit de chuvas de 50% somente neste ano.
A Mata Atlântica e o Cerrado já são considerados hotspot, ou seja, biomas muito ricos em biodiversidade, mas que tem sérios riscos de extinção de suas espécies. Rômulo Batista, do Greenpeace Brasil, explica que para ser considerado um hotspot o bioma deve ter perdido aproximadamente ¾ da vegetação e que o objetivo da classificação é chamar a atenção para o estado de calamidade.
“Nós temos que nos engajar e unir para que a Amazônia não se torne um hotspot”, alerta Batista. Ele acrescenta que a devastação da floresta amazônica provoca o efeito conhecido como “savanização”, isto é, a transformação de áreas antes dominadas por florestas do tipo “sempre-verde” por vegetação de menor estatura e marcada pela presença de extensos campos, com árvores espaçadas. “A savanização pode resultar na redução das espécies e afetar o regime de chuvas”.
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