"Esse pojeto político e econômico fóssil promove a privatização de lucros e socialização dos prejuízos"
Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil
"Esse pojeto político e econômico fóssil promove a privatização de lucros e socialização dos prejuízos"
Letícia Camargo* - brasil De Fato | Brasília (df) - 13/02/2025 16:39:13 | Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil
"Sem consulta adequada às comunidades e contra nossos compromissos internacionais climáticos já firmados, a ambição de alas do governo que fomentam o avanço fóssil no Brasil seguem insistindo no bloco 59".
Há mais de 10 anos que se tenta o licenciamento ambiental para exploração de petróleo do bloco 59 na Foz do rio Amazonas. São muitos estudos e modelagens frágeis sobre este lugar que, segundo dados do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) por meio das Cartas de Sensibilidade Ambiental a Derramamentos de Óleo (Cartas SAO), programa do governo que indica as áreas mais sensíveis ao petróleo e gás realizado junto à Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), é totalmente inadequado para a atividade.
A região prevista contempla a costa do estado do Amapá, mas com efeitos no Pará, Maranhão e até o Caribe em caso de vazamento. Nesta área estão os manguezais da Amazônia que correspondem a mais de 80% dos manguezais do Brasil e possui o maior cinturão ininterrupto do mundo, o que significa uma faixa extremamente relevante no combate às mudanças climáticas.
Isto porque estimativas indicam que um hectare de manguezal pode armazenar entre duas e quatro vezes mais carbono do que um mesmo hectare de outro bioma qualquer — incluindo a floresta amazônica —, segundo um estudo publicado no início de 2022 na revista Frontiers in Forests and Global Change . Ainda, tanto os manguezais quanto os bancos de corais, recentemente descobertos desta região, cuja importância biológica apenas começa a ser vislumbrada, possuem importância por serem locais de reprodução, fonte de alimentos e berçário para diversas espécies marinhas.
Além de representar uma ameaça ambiental, a exploração de petróleo na Foz do Amazonas traz consigo riscos de prejuízos sociais imensos para as populações que ali habitam. Na área que será afetada por uma possível exploração do Bloco 59, encontram-se ao todo 16 reservas extrativistas no Pará e Maranhão, três Terras Indígenas no alto do Oiapoque no Amapá e inúmeras terras quilombolas, homologadas ou não, ao longo deste litoral.
Este é um território muito suscetível às mudanças climáticas. Por três anos, por exemplo, o governo do Amapá decretou estado de emergência por falta de água. Já existem comunidades ribeirinhas migrando em razão de desiquilíbrios ambientais como a diminuição da oferta de peixes, a salinização de fontes de águas doce no litoral, em razão da prolongada estiagem, falta de chuva e pelas elevadas temperaturas constantes. Da mesma forma, as temperaturas elevadas da água foram associadas à morte significativa de vida aquática, incluindo mais de 150 golfinhos cor-de-rosa, uma espécie ameaçada de extinção.
Sem consulta adequada às comunidades e contra nossos compromissos internacionais climáticos já firmados, a ambição de alas do governo que fomentam o avanço fóssil no Brasil seguem insistindo no bloco 59. O problema maior é que esta é apenas a ponta do iceberg, ou a porteira da boiada que querem passar na costa Amazônica. Segundo o Monitor da Amazônia Livre de Petróleo e Gás, que acompanha a situação do setor de Petróleo e Gás nos países Pan-Amazônicos, ao todo são 328 blocos disponíveis entre o litoral do Amapá, Pará e Maranhão.
O quinto ciclo de oferta permanente de blocos para exploração, que foi lançado em fevereiro de 2025 pelo governo com várias áreas na foz do Amazonas em leilão, confirma isso. O que eles querem é implementar uma grande fronteira do petróleo e gás colocando como um “novo pré-sal” a região litorânea da Amazônia. Será uma grande área de exploração que modificará para sempre sua identidade, pois vai restringir a pesca, vai criar rotas de navegação intensas, vai fomentar a ocupação desordenada, vai gerar contaminação por depósito de rejeito de perfuração e vai apresentar risco grave de vazamentos em larga escala.
Durante muito tempo os analistas do Ibama (DILIC) foram pressionados para aprovarem este licenciamento, mas conseguiram segurar a proposta com fundamentação e coragem. Na última manifestação dos técnicos eles recomendaram que fechassem o processo, considerando que em mais de 10 anos a Petrobras apresentou inúmeras falhas aos pedidos do Ibama. O pedido não foi atendido e a Petrobras no momento está encaminhando as pendências. Segundo entrevista recente do presidente do Ibama, o processo está na última etapa e a licença pode vir a partir de março de 2025.
Além da incoerência desta iniciativa acontecer em pleno ano de COP30, em que a Amazônia será anfitriã, há ainda a argumentação de que esta iniciativa se justifica por poder ser fonte de financiamento para uma transição energética no Brasil, como um caminho para a saúde climática do país. Entretanto, não se cuida do pulmão com cigarro, da cirrose bebendo, ou da diabete com doces.
Assim, o cenário demanda radicalizar a luta por um futuro livre do petróleo, pela transição energética justa e inclusiva e pela preservação da biodiversidade, com protagonismo dos povos atingidos e contra o atual projeto político e econômico fóssil que promove a privatização de lucros e socialização dos prejuízos.
*Letícia Camargo é gestora ambiental, foi Assessora Técnica de Políticas Socioambientais no Congresso Nacional e atua como advocacy socioambiental do Painel Mar.
**Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato - DF.
:: Clique aqui para receber notícias do Brasil de Fato DF no seu Whatsapp ::
Edição: Rafaela Ferreira
Comentários para "Manguezais, corais e povos ameaçados: os riscos da exploração petrolífera na Amazônia":