Pichadora de estátua no 8/1 e lembrada em atentado a bomba escreve carta com desculpas a Moraes
Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
Pichadora de estátua no 8/1 e lembrada em atentado a bomba escreve carta com desculpas a Moraes
José Marques, Brasília, Df (folhapress0 - 08/01/2025 07:15:41 | Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
Presa três meses após os ataques que depredaram as sedes dos três Poderes em 8 de janeiro de 2023, a mulher que pichou a estátua "A Justiça", em frente ao STF (Supremo Tribunal Federal), chegou a fazer uma solicitação de próprio punho pedindo desculpas ao ministro Alexandre de Moraes.
Fotos registradas pela Folha durante a destruição, há dois anos, identificaram a cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos, 39. O STF avalia a obra entre R$ 2 milhões e R$ 3 milhões -é uma das principais do artista mineiro Alfredo Ceschiatti.
Em novembro passado, o nome dela voltou a aparecer em outro evento relacionado a um ataque antidemocrático. A polícia encontrou um recado que mencionava Débora na casa alugada por Francisco Wanderley Luiz, o Tiu França, que morreu ao cometer um atentado a bomba ao lado da estátua da Justiça.
Não há, no entanto, qualquer indício de relação entre os dois.
Ré, mas ainda sem julgamento que a condene ou absolva, a cabeleireira afirmou na carta que desconhecia a simbologia da estátua e seu valor material, além de ter pedido desculpas pela ignorância.
Na missiva, também afirmou que agora compreende o significado simbólico e histórico do monumento para o país e para a Justiça. A cabeleireira argumentou ainda que hoje sabe que a estátua tem um nome, o que ela disse desconhecer antes.
Até agora o apelo não resultou em uma decisão a seu favor –assim como outros pedidos feitos pelos seus advogados.
A estátua foi pichada com batom, e lavada nos dias seguintes aos ataques que ocorreram na praça dos Três Poderes.
Débora é casada, tem dois filhos, de 6 e 11 anos, e residência em Paulínia, no interior de São Paulo. Atualmente, ela está detida no Centro de Ressocialização Feminino de Rio Claro, a uma hora de distância.
Para pedir sua liberdade, os advogados têm mencionado a vulnerabilidade afetiva e emocional das crianças, a ausência de antecedentes criminais de Débora e também a falta de risco de que ela reincida em crimes. Também afirmam que ela tem residência fixa e família estável.
Em um dos pedidos feitos ao STF, a defesa argumentou que ela não é filiada a partido político, não "é um dos ativistas chamados de bolsonaristas" e não teria ingressado em nenhum dos edifícios depredados, ficando apenas "perto da estátua da Justiça, onde teve a ideia de pichar a estátua da justiça com batom vermelho, e não teve a intenção de danificar [o monumento]".
A frase pichada na escultura foi uma referência à resposta do ministro do STF Luís Roberto Barroso a um apoiador de Bolsonaro, em novembro de 2022. "Perdeu, mané. Não amola!", disse o ministro ao homem que o abordara em Nova York.
A defesa da cabeleireira é feita pelos advogados Tanieli Telles Padoan e Hélio Júnior, que também acompanham a situação de outros presos no 8 de janeiro.
Débora se tornou ré pelo 8 de janeiro em agosto do ano passado, sob acusação da Procuradoria-Geral da República pela prática dos crimes de associação criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado e dano qualificado por violência e grave ameaça, contra o patrimônio da União.
O último julgamento relacionado ao caso aconteceu em setembro, e os ministros da Primeira Turma do STF (além de Moraes, Flávio Dino, Cármen Lúcia, Cristiano Zanin e Luiz Fux) rejeitaram o pedido de Débora.
Moraes afirmou em seu voto que apesar de ela ser mãe de duas crianças, a gravidade concreta dos fatos imputados à investigada "constitui situação excepcional a obstar a substituição da prisão preventiva pela domiciliar".
A técnica de enfermagem Cláudia Rodrigues Leal, irmã de Débora, criticou à Folha a situação imposta a ela.
"Em 17 de março fará dois anos que a Débora foi presa, e a sensação que nós temos é que ela foi esquecida lá [na prisão]. Trancafiaram lá dentro, esqueceram a chave e esqueceram dela", diz Cláudia.
"Tudo o que é pedido pelos advogados é negado por parte do ministro Alexandre de Moraes".
Ela diz que a família está indignada com a afirmação de que Débora causaria risco à sociedade. "Eu falo como pessoa, não como irmã. Ela é cristã, é mãe, sempre trabalhou, tem residência fixa, ré primária, nunca cometeu nenhum tipo de crime nem nada errado. Ser vista como risco à sociedade por ter escrito em uma estátua com batom... que risco é esse que ela causa à sociedade?", questiona a irmã.
Cláudia relata que, na prisão, a irmã dorme em uma cela ocupada por 13 pessoas. Atualmente faz trabalhos internos com montagem de semijoias, mas já trabalhou também na cozinha. Aos sábados, frequenta o culto.
A irmã afirma que as crianças não têm dimensão de tudo o que está acontecendo, mas que é difícil especialmente em datas comemorativas, como o Natal e o Ano-Novo.
O nome de Débora voltou à tona algumas vezes no último ano. No meio do ano, parlamentares aliados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), como Bia Kicis (PL-DF) divulgaram vídeos pedindo que ela fosse libertada.
O recado que o autor do atentado a bomba deixou na casa em que viveu os últimos dias também foi escrito de batom. No espelho do banheiro da casa de Ceilândia, região administrativa do Distrito Federal, o nome Débora Rodrigues estava escrito em vermelho.
Mais abaixo, aparecia o seguinte texto: "Por favor, não desperdice batom! Isso é para deixar as mulheres bonitas. Estátua de merda se usa TNT".
Bolsonaristas insistem em anistia e chamam ato do governo para 8/1 de cortina de fumaça
MARIANNA HOLANDA, BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) insistem na anistia para os presos nos ataques golpistas às sedes dos três Poderes em 8 de janeiro de 2023 e classificam os ato marcados pelo presidente Lula (PT) como "cortina de fumaça" para problemas do governo.
O Palácio do Planalto fará nesta quarta-feira (8) a apresentação de obras depredadas e agora restauradas, como o quadro "As Mulatas", do pintor Di Cavalcanti, seguida por uma cerimônia com autoridades. Por fim, haverá um abraço simbólico com a militância de esquerda na praça dos Três Poderes.
Dois anos depois dos ataques, bolsonaristas mantém discurso de que não houve tentativa de golpe e de que há prisões ou penas injustas. Deputados e senadores do PL, partido de Bolsonaro, dizem ainda acreditar que o projeto que propõe a anistia terá andamento neste ano, apesar de o tema ter estacionado no ano passado.
"O governo segue tentando fazer cortinas de fumaças sobre o desastre que tem sido essa administração", diz o deputado Carlos Jordy (PL-RJ), líder da oposição na Câmara.
"Inflação alta, juros explodindo, dólar num patamar nunca antes visto, preço dos alimentos cada vez mais altos, e tudo o que esse governo sabe fazer é reviver diariamente o 8 de janeiro e alimentar essa narrativa de golpe, uma ditadura imaginária."
Jordy foi alvo de buscas da Polícia Federal em janeiro de 2024 no âmbito da Operação Lesa Pátria, destinada a identificar pessoas que planejaram, financiaram e incitaram os ataques do 8 de janeiro.
Já o líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RN), criticou Lula por fazer um paralelo entre eles e a ditadura de 1964. Queixou-se ainda de perseguição a adversários e disse que o petista fará circo na praça dos Três Poderes.
"O presidente que fala de democracia inabalada é o mesmo que defende democracia relativa da Venezuela. Dois dias depois do circo da praça dos Três Poderes, o Brasil estará representado oficialmente no estupro da democracia da Venezuela", disse Marinho, que foi ministro de Bolsonaro.
O senador se refere ao fato de que o governo brasileiro estará representado na posse do ditador Nicolás Maduro, na Venezuela, com a embaixadora em Caracas, Glivânia Maria de Oliveira, apesar de não reconhecer oficialmente o resultado das eleições do ano passado no país vizinho.
Entre bolsonaristas, a avaliação geral é de que o clima já distensionou um pouco desde o relatório da PF que pediu o indiciamento de quase 40 bolsonaristas, dentre eles o próprio ex-presidente, por suposta tentativa de golpe em 2022. O mesmo ocorre com relação ao atentado com bombas em frente ao STF (Supremo Tribunal Federal), em novembro passado.
O grupo acredita que Hugo Motta (Republicanos-PB), provável presidente da Câmara a partir de fevereiro, seguirá o compromisso dito a dirigentes do PL de colocar para votar a proposta de anistia. A chance de aprovação do texto, no entanto, é vista como remota mesmo entre os mais otimistas.
Eles citam o peso do governo contra a medida, com a possibilidade de a base postergar a indicação de nomes para a comissão especial que deve ser criada para o tema. Além disso, há possibilidade de não haver votos no plenário.
"Não posso ser assertivo por uma situação que não depende de mim. O Parlamento, ao contrário do Executivo, é plural. Claro que se tem presidente da República numa sanha persecutória, estimulando aniquilação de campo político, isso fica mais difícil, mas temos argumentos racionalidade e necessidade de pacificar o país. Se presidente não tem estatura para isso, Congresso tem que ter", afirmou Marinho.
O fato de Hugo Motta ter sido convidado para o ato no Palácio do Planalto e não comparecer foi interpretado como um gesto positivo por deputados bolsonaristas. Ele costurou apoio para sucessão de Arthur Lira (PP-AL) desde o PT ao PL.
"É um democrata, cidadão de bem. Não tem por que participar, e tem compromisso conosco em colocar pra votar o PL da anistia", disse o deputado Bibo Nunes (PL-RS).
Deputados de oposição mais céticos, por sua vez, acreditam que a proposta tem poucas chances de prosperar e que Hugo Motta não comprará desgaste com o governo para isso.
Não há previsão de ato, a princípio, por parte da oposição para defender os presos. A avaliação é de que a data não é boa para eles, e Marinho chega a dizer que é preciso "esquecer, não lembrar" do episódio.
Ainda assim, a previsão é de que muitos se manifestem em redes sociais, sobretudo para criticar o ato do governo Lula, que neste ano deve ter um caráter mais político do que o do ano passado.
Lula faz ato do 8/1 sob mal-estar com militares e ausência de expoentes do Congresso
CATIA SEABRA E MARIANNA HOLANDA, BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS0 - O presidente Lula (PT) prepara para esta quarta-feira (8) cerimônia em memória dos atos golpistas de janeiro de 2023 em meio a esvaziamento político e descontentamento de militares.
Em 8 de janeiro daquele ano, uma horda de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) saiu de um acampamento diante do QG do Exército e destruiu as sedes dos Três Poderes, em Brasília.
A data ficou marcada com um dos maiores ataques à democracia -o STF (Supremo Tribunal Federal) já condenou 375 réus pelos ataques, que resultaram na denúncia de 1682 envolvidos.
Embora tenha ouvido confirmações informais de presença, segundo relato de integrantes do governo, Lula pode ver frustrada a expectativa de participação de representantes de partidos que integram a sua base governista, limitando a agenda a uma manifestação de esquerda.
O presidente anunciou o evento em sua última reunião ministerial no ano passado, e pediu que todos os chefes das pastas estivessem presentes em Brasília. Ele tem repetido que espera fazer de 2025 um marco em defesa da democracia na política.
Mas, na caserna e dentro do próprio governo, há receio de que discursos inflamados acirrem os ânimos no meio militar, já abalado com a prisão de oficiais de alta patente.
Há ainda o risco de baixas entre aliados do centrão. Apesar de terem sido convidados parlamentares, governadores e ministros, a cúpula do Congresso não deve comparecer.
A assessoria do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse que ele está em viagem, programada anteriormente, mas que o primeiro vice-presidente da Casa, Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), representará o Senado na ocasião.
A negativa decepciona o Planalto, que contava com sua presença, devido à sua atuação em defesa da democracia.
As cerimônias acontecem em um momento de redesenho da Esplanada, com a possibilidade de nomeação de líderes do Congresso numa reforma ministerial. O nome de Pacheco é frequentemente citado nessas conversas.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), por sua vez, está em Alagoas com o pai, Benedito Lira (PP-AL), doente. Apesar de não ter confirmado a sua ausência, ela dada como certa por aliados. No evento do ano passado, pressionado por bolsonaristas, ele também não compareceu.
De acordo com relatos, o próprio presidente chegou a convidá-los. E, antes do Natal, teria recebido confirmações das presenças.
Também não devem comparecer os prováveis sucessores das presidências das Casas. O senador Davi Alcolumbre (União-AP) e o deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) estão em seus redutos eleitorais durante esse recesso.
A eleição para as mesas ocorrerá no início de fevereiro, na volta do recesso parlamentar. Sua presença poderia afugentar parlamentares bolsonaristas, eleitores na disputa pelos comandos da Câmara e Senado.
Dirigentes partidários de siglas que integram a Esplanada também não acompanharão a cerimônia do governo: Gilberto Kassab (PSD), Baleia Rossi (MDB) e Marcos Pereira (Republicanos).
Além disso, o governo encerrou um ano sob tensão com deputados e senadores, após meses de imbróglio sob pagamento de emendas com o STF. Integrantes do Planalto acreditam que ao menos parte das baixas possa ser justificada com o clima de descontentamento.
Da parte do Supremo, apenas três participarão. O ministro Edson Fachin comparecerá representando a presidência, no lugar de Luís Roberto Barroso. Além dele, Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes.
De acordo com auxiliares palacianos, a intenção é reforçar a ideia de reconstrução dos espaços e das obras destruídas nos atos golpistas e fazer uma enfática defesa da democracia. Lula vai apresentar quadros e estátuas depredadas, como a obra "As Mulatas", de Di Cavalcanti.
Depois, descerá a rampa para um ato com a militância na Praça dos Três Poderes, onde ocorrerá um abraço simbólico ao local. A expectativa dos organizadores é de reunir cerca de mil pessoas.
Ministros e políticos de esquerda devem acompanhá-lo, mas os militares que participarem da cerimônia não devem comparecer ao ato, que é considerado de teor político.
O ministro José Múcio (Defesa) e os comandantes das três Forças estão confirmados no Palácio do Planalto. No ano passado, uma fala de Lula sobre "militares legalistas" gerou incômodo entre os militares, o que integrantes do alto escalão das Forças acreditam que deve se repetir neste ano.
Integrantes das Forças Armadas já têm temor de mal estar com o tema, que é considerado delicado na caserna - sobretudo diante do avanço das investigações da PF (Polícia Federal), que já prenderam generais e revelaram plano para assassinato de Lula, Geraldo Alckmin (PSB) e Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal).
Na reunião em que convidou seus ministros para o ato, Lula falou da importância da defesa da democracia e mencionou a prisão de Walter Braga Neto, general quatro estrelas preso por suposto envolvimento na tentativa de golpe de Estado. O presidente disse ter ficado feliz, por representar ação contra impunidade.
Apesar disso, militares do governo avaliam que o mal estar está precificado e o comandante do Exército, Tomás Paiva, deve sofrer críticas de integrantes mais radicais da reserva. Ainda assim, o momento de maior tensão foi o das prisões dos generais no ano passado e o relatório da PF.
Os gritos de "sem anistia" puxados pela na plateia de aliados neste ano devem se repetir e ganhar corpo em seguida com o ato da militância na Praça dos Três Poderes.
Na Câmara dos Deputados, há um projeto de lei que prevê o benefício para os presos nos atos golpistas. Lira prometeu votar o projeto ainda durante a sua gestão, o que não ocorreu. Agora, Hugo Motta enfrenta a pressão de bolsonaristas para levar adiante o tema.
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