Motivação para o curso foi a baixa taxa de alfabetização.
Victória Pacheco, São Paulo, Sp (folhapress) - 21/04/2025 10:47:16 | Foto: Agência de Notícias da Indústria
Na época da escola, estudar era um martírio para o paulistano Vinícius de Miranda, 23. Os conteúdos "não entravam na cabeça" e ele se sentia exausto com as aulas em período integral.
Ao ingressar no curso de alfabetização do Instituto Unidown em março deste ano, o jovem com síndrome de Down encontrou diversão no aprendizado.
Ele é um dos 12 alunos que participam semanalmente da formação com ênfase no desenvolvimento de habilidades de leitura e escrita para o mercado de trabalho.
"Já lia e escrevia antes, mas agora estou evoluindo para conquistar meu objetivo, que é conseguir um emprego e, mais tarde, virar empresário", conta Vinícius.
Uma de suas partes preferidas das aulas é o Joca, jornal infantojuvenil utilizado como recurso didático a fim de aprimorar oralidade, conhecimentos sobre atualidades e compreensão textual dos estudantes.
"O jornal tem uma linguagem adequada para crianças e adolescentes, mais acessível do que a de publicações tradicionais", diz Cristina Harich, diretora educacional da editora Magia de Ler, que doa exemplares quinzenais aos participantes da capacitação de três meses.
"Ele é dividido em seções, com temas variados de interesse infantojuvenil. Há também assuntos atuais, como a Guerra da Ucrânia, que precisam ser comunicados a eles, mas sem conotação violenta e de forma neutra, priorizando os fatos."
Segundo Gizele Caparroz, idealizadora e uma das professoras do curso, o Joca é usado na dinâmica da "roda de notícias", em que os alunos se reúnem para comentar o conteúdo das matérias de que mais gostaram.
Na sequência, eles criam um banco de palavras com termos novos, que servem de base para a escrita coletiva de textos.
"Como são todos adultos, não queríamos dar um livro didático tradicional para eles. É importante que esses jovens tenham repertório de mundo e saibam falar sobre o que está acontecendo hoje. Nada melhor que um jornal para isso", afirma a conselheira do instituto.
Além disso, são usados jogos de tabuleiro, que apoiam o aprendizado de matemática básica e gramática, e aplicativos para trabalhar conceitos como dezena, unidade e dúzia. As professoras também propõem dinâmicas com calculadoras e simulações de entrevistas de emprego.
Motivação central para a criação do curso foi a baixa taxa de alfabetização de jovens com a síndrome. Entre as mais de 1.300 pessoas atendidas pelo Unidown, apenas 8,7% são totalmente alfabetizadas, e 1,3% conseguem se deslocar sozinhas usando transporte público.
Esses eram empecilhos para que participantes das capacitações promovidas pela entidade em áreas como informática, fotografia e atendimento em restaurantes e hotéis tivessem sucesso em processos seletivos.
"Eles faziam a parte prática, mas, ao avançarem para tarefas mais complexas, como anotar um pedido ou preencher uma ficha de emprego, tinham dificuldades. Na hora da entrevista, não conseguiam passar", relata Gizele, que se dedicou ao desenvolvimento do curso por um ano.
As duas turmas-piloto, divididas de acordo com o nível de proficiência em leitura e escrita dos estudantes, têm aulas às segundas-feiras, na sede do instituto, na Lapa, zona oeste da capital paulista. A professora Lilian Fotin Talib leciona para a turma da tarde, e Gizele, para a da manhã.
O módulo inicial prevê 16 encontros. No final de junho, uma avaliação vai aferir o progresso dos alunos e decidir quem continuará para o segundo semestre.
O Estatuto da Pessoa com Deficiência, instituído em 2015, reforça o direito dessas pessoas à educação de qualidade, em igualdade de oportunidades e condições com as demais. No entanto, a inclusão nas salas de aula avançou lentamente ao longo dos anos, segundo a conselheira do instituto.
"Escolas estão parando de tirar pessoas com síndrome de Down ou autistas da turma, mas isso ainda acontecia com a geração de alunos que atendemos", diz ela.
"Queremos dar uma formação de qualidade, com tudo a que eles têm direito. Aprender a escrever, interpretar e mexer no computador, sendo orientados por alguém com paciência."
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