Afluente do Rio Amazonas perto de Manaus, capital do estado do Amazonas, Brasil.
Agência Xinhua Brasil - 13/07/2025 12:01:35 | Foto: Agência Xinhua/Wang Tiancong
Em sua ascensão rumo à modernização e a um futuro sustentável, o Brasil, assim como muitos outros países em desenvolvimento, enfrentou desafios e sobreviveu a transformações.
Rio de Janeiro, 7 jul (Xinhua) -- Para o Brasil, a "Terra do Futuro" significou mais do que uma homenagem do escritor austríaco Stefan Zweig, que se refugiou no país sul-americano após uma guerra na década de 1940. O título virou um sonho que inspira gerações de brasileiros a lutar pela realização dele.
Em sua ascensão rumo à modernização e a um futuro sustentável, o Brasil, assim como muitos outros países em desenvolvimento, enfrentou desafios e sobreviveu a transformações. Um peso-pesado no Sul Global, o país sediou a 17ª Cúpula do BRICS, que aconteceu de domingo a segunda-feira, chamando atenção global mais uma vez.
CELEIRO DO MUNDO
Nas memórias de infância do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que nasceu em uma família pobre em 1945, sua mãe às vezes não tinha comida para alimentar os filhos. Ele se lembra de ter comido pão pela primeira vez apenas aos sete anos de idade. A experiência de Lula ilustrou, em parte, a fome enfrentada pelo Brasil rural até meados do século 20.
A dra. Mariangela Hungria dedicou décadas ao combate à fome no Brasil, muito antes de sua pesquisa inovadora em microbiologia de sementes e solo lhe render o Prêmio Mundial da Alimentação 2025. Seu trabalho pioneiro revolucionou a agricultura do país, transformando a inovação científica em esperança tangível para a segurança alimentar.
O Brasil possui a quinta maior área territorial do mundo, com vastas terras férteis para cultivo e pastagens, com mais de 112 milhões de hectares de terras aráveis e mais 60 milhões de hectares inexplorados.
No entanto, durante séculos, os colonizadores europeus, movidos pelo lucro, priorizaram culturas comerciais voltadas para a exportação em detrimento da alimentação básica, o que acabou levando o país à dependência de importações de alimentos.
Um agricultor segura milho em fazenda perto de Brasília, Brasil, no dia 19 de junho de 2023. (Foto por Lucio Távora/Xinhua)
Em 1973, as fortes flutuações nos preços globais dos grãos, desencadeadas pela crise do petróleo, levaram o governo brasileiro a romper sua dependência de alimentos importados e a reformular seu sistema agrícola.
Fundada naquele mesmo ano, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) se tornou a plataforma de lançamento para cientistas como Hungria traduzirem avanços de laboratório em aplicações de campo. Os inoculantes biológicos de sua equipe agora cobrem mais de 40 milhões de hectares de terras agrícolas brasileiras, economizando 25 bilhões de dólares anualmente em fertilizantes para os agricultores, ao mesmo tempo em que impulsiona a produção sustentável.
Foto aérea de drone tirada em 6 de agosto de 2024 mostra colheitadeira em fazenda de algodão em Cristalina, Goiás, Brasil. (Foto por Lucio Tavora/Xinhua)
A inovação tecnológica tem sido a força motriz por trás da modernização agrícola do Brasil. Complementando esses avanços, o governo implementou reformas estruturais, quebrando monopólios de terras, acelerando a mecanização e estabelecendo sistemas robustos de crédito rural, ao mesmo tempo em que modernizava constantemente a infraestrutura para apoiar a modernização.
O setor tem apresentado resultados frutíferos. De 2000 a 2020, o valor da agricultura brasileira cresceu 8% ao ano, em média. O Brasil virou o maior produtor mundial de commodities agrícolas, como soja, carne bovina e frango. O país se tornou basicamente autossuficiente em alimentos básicos e fontes de proteína.
Um relatório da ONU mostrou que o número de brasileiros afetados por insegurança alimentar grave em 2023 caiu para 2,5 milhões, representando 1,2% da população.
No entanto, os desafios duplos do Brasil persistem: embora a modernização agrícola tenha reduzido a fome, ela continua tendo um custo ambiental. A expansão contínua de terras agrícolas em ecossistemas sensíveis, principalmente em regiões de floresta tropical, acelerou a perda de biodiversidade. Enquanto isso, o setor agora enfrenta uma transição essencial para a intensificação sustentável, exigindo soluções equilibradas para a segurança alimentar e para a preservação ecológica. Hungria afirmou: "A solução fundamental ainda está na melhoria do solo".
AMBIÇÃO NA AVIAÇÃO
No centro do planalto brasileiro está Brasília, uma capital em forma de avião a jato, com asas estendidas em concreto e vidro. Projetada por Oscar Niemeyer há mais de 60 anos, essa maravilha modernista personificava as ambições do Brasil. A forma aerodinâmica da cidade provou ser profética, mostrando a ascensão posterior do país como potência da aviação.
Hoje, o Brasil domina o mercado de aeronaves comerciais de médio porte como o maior produtor mundial de jatos com menos de 150 assentos. A Embraer, fundada em 1969, agora é a terceira maior fabricante de aviões comerciais do mundo, depois das gigantes da aviação Boeing e Airbus, com mais de 9.000 aeronaves entregues a operadores globais.
Os investimentos pioneiros do Brasil em aviação nasceram da necessidade e da ambição, explica Fernando Grau, diretor de Pesquisa de Mercado e Produtos da Embraer. As vastas extensões e o terreno desafiador do país tornaram o transporte aéreo essencial para a integração nacional, enquanto aeronaves importadas frequentemente falhavam em condições tropicais, criando as condições perfeitas para a inovação aeroespacial nacional.
Em 1950, o Brasil criou o Instituto Tecnológico de Aeronáutica para treinar talentos da aviação. Após duas décadas, a Embraer começou a lançar aeronaves de design nacional, rapidamente ganhando força nos mercados globais.
O setor passou por turbulências na década de 1990, com a Embraer quase falindo antes que uma privatização liderada pelo governo ajudasse a reposicionar a empresa. Parcerias estratégicas e o foco em jatos regionais e executivos impulsionaram sua recuperação.
Aeronave decola no Aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, Brasil, no dia 1º de março de 2024. (Xinhua/Wang Tiancong)
A colaboração com outros países do Sul Global, principalmente com a China, tem se mostrado essencial. Uma joint venture na cidade de Harbin, no nordeste da China, começou em 2003, e a indústria da aviação continua sendo um pilar importante da cooperação sino-brasileira.
"China e Brasil construíram o que é considerado um modelo de cooperação Sul-Sul em indústrias de alta tecnologia", disse Patrick Peng, presidente da Embraer China. "Estamos confiantes de que nossa parceria com a China e com outros países do Sul Global continuará gerando benefícios mútuos e criando oportunidades de desenvolvimento".
Apesar da forte concorrência de gigantes ocidentais, a Embraer conquistou uma vantagem competitiva. O sucesso da fabricante de aeronaves advém do controle de etapas críticas da cadeia de valor, desde o projeto da aeronave e a integração de sistemas até a fabricação e as vendas, afirmou Marcos Ferreira, professor da Universidade Estadual de Campinas.
TRANSIÇÃO VERDE
Situada na fronteira entre o Brasil e o Paraguai, a monumental Usina de Itaipu aproveita a força estrondosa do Rio Paraná. Como um dos projetos hidrelétricos mais formidáveis do planeta, esse colosso da engenharia transforma o fluxo implacável da hidrovia em uma fonte de energia sustentável para ambos os países.
Desde que sua turbina inaugural entrou em operação em 1984, Itaipu tem produzido consistentemente cerca de 80 terawatts-hora de eletricidade anualmente, atendendo a aproximadamente 10% da demanda total de energia do Brasil.
Navegar na tensão entre desenvolvimento econômico e preservação ecológica continua sendo um desafio decisivo para as economias emergentes. O Brasil se juntou à vanguarda dos países que buscam um modelo de crescimento verde, que alinha o avanço industrial com a gestão ambiental.
Há décadas, o Brasil vem acelerando sua transição energética, principalmente por meio do desenvolvimento de energia hidrelétrica, juntamente com outras energias renováveis, como a eólica e a solar. De acordo com a Empresa Brasileira de Pesquisa Energética (EPE), as energias renováveis já representam quase metade da matriz energética do país.
Nos últimos anos, o investimento e a tecnologia da China injetaram novo impulso ao desenvolvimento verde do Brasil. No início deste ano, o Projeto Fotovoltaico Mauriti, investido e construído pela empresa chinesa PowerChina, atingiu plena capacidade de conexão à rede, com previsão de redução de cerca de 8,2 milhões de toneladas de emissões de dióxido de carbono anualmente.
Em agosto passado, empresas chinesas e brasileiras assinaram um acordo para o desenvolvimento conjunto de uma usina de hidrogênio verde de 1 megawatt. Assim que concluída, ela produzirá até 200 metros cúbicos padrão de hidrogênio verde por hora.
Enquanto isso, a joint venture Brasil-China para o projeto de transmissão de corrente contínua de ultra-alta tensão de Belo Monte prioriza a proteção ecológica ao longo de sua rota, restaurando cerca de 200 hectares de cobertura florestal.
Para conter a expansão desenfreada do desenvolvimento econômico que havia rapidamente esgotado a floresta amazônica, Lula assinou vários decretos ao retornar ao cargo em 2023, incluindo a renovação de medidas de combate ao desmatamento e o restabelecimento do Fundo Amazônia. Como resultado, o desmatamento na Amazônia caiu 50% em relação ao ano anterior, somente em 2023.
"Uma árvore em pé vale mais do que toneladas de madeira extraída ilegalmente por quem só pensa no lucro fácil, às custas da deterioração da vida na Terra", disse Lula em seu discurso de vitória como presidente reeleito. "Um rio de água limpa vale muito mais do que todo o ouro extraído às custas do mercúrio que mata animais e coloca vidas em risco".
Com o lançamento do Programa Grande Selo em 2024, o governo Lula estabeleceu padrões de sustentabilidade socioambiental em diversos setores, certificando produtos e serviços alinhados às regulamentações. Também introduziu "ações verdes" para incentivar as empresas a aumentar os investimentos ambientais e direcionar capital para indústrias verdes.
Paralelamente, o governo também revelou o Programa de Mobilidade Verde e Inovação para promover a redução de emissões e a descarbonização no setor automotivo.
Como a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas será realizada em Belém, Brasil, em novembro, a ministra do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas do país, Marina Silva, afirmou que o Brasil está comprometido em fortalecer a solidariedade e a cooperação com os países do Sul Global para desempenhar um papel mais amplo nos esforços climáticos multilaterais.
FORTALECIMENTO DA COOPERAÇÃO GLOBAL SUL
No início deste século, Guaribas, cidade no norte do Piauí, era conhecida como a "cidade da fome" devido ao seu isolamento e subdesenvolvimento. Mais de duas décadas depois, essa cidadezinha do interior passou por uma transformação notável, com avanços significativos nas redes de abastecimento de água e energia elétrica, moradia acessível, além de serviços de educação e saúde.
Eraques Alves, 33 anos, viu a metamorfose de Guaribas com os próprios olhos. "Quando eu tinha oito ou nove anos, a agricultura era nossa única fonte de renda. Quando criança, eu ia para a roça com meus pais", disse ele.
Graças ao apoio do governo, sua trajetória de vida mudou completamente. Ele fundou uma empresa que fornece serviços de TI para a cidade, reinvestindo na comunidade onde cresceu.
Ele atribui as mudanças a programas sociais, como o "Fome Zero" e o "Bolsa Família", introduzidos em 2003 no Brasil. Guaribas foi escolhida como local de lançamento da iniciativa "Fome Zero", que levou a grandes melhorias no abastecimento de água, saneamento e estradas. A mãe de Alves também foi uma das primeiras beneficiárias do programa "Bolsa Família".
Através de sua trajetória de desenvolvimento autossuficiente, o Brasil impulsionou a expansão econômica modernizando a agricultura e a indústria, defendeu o crescimento sustentável por meio de iniciativas ecológicas e elevou o padrão de vida da população, combatendo a pobreza e a desigualdade por meio de programas sociais direcionados.
Dados oficiais mostram que, de 2003 a 2011, cerca de 20 milhões de pessoas no Brasil saíram da pobreza.
Lula afirmou que seu país está comprometido em trilhar um "caminho brasileiro para a modernização", que integre crescimento econômico, redução da pobreza e da desigualdade e uso sustentável dos recursos naturais.
Da perspectiva do Brasil, os países do Sul Global têm desafios comuns na erradicação da fome, da pobreza e da desigualdade e, portanto, precisam de maior solidariedade, cooperação e fortalecimento coletivo. Em 2024, como presidente rotativo do G20, o Brasil lançou a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza para ajudar os países a coordenar respostas, desenvolver políticas e mobilizar financiamento para enfrentar essas questões urgentes.
Trabalhadores reunidos perto de cartaz no local da cúpula do G20 no Rio de Janeiro, Brasil, no dia 16 de novembro de 2024. (Xinhua/Wang Tiancong)
A ascensão coletiva do Sul Global é uma característica definidora das profundas mudanças que estão remodelando o mundo. A jornada compartilhada dos países do Sul Global rumo à modernização marca um capítulo significativo na história mundial. Nesse processo histórico, o Brasil está deixando sua marca distinta e contribuindo com sua sabedoria e força.
Como anfitrião da 17ª Cúpula do BRICS, o Brasil ancorou o encontro com o tema escolhido, "Fortalecendo a Cooperação do Sul Global para uma Governança Mais Inclusiva e Sustentável". Segundo a ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação do Brasil, Luciana Santos, o Brasil espera trabalhar em conjunto com outros países do Sul Global para construir um mundo mais multipolar, fundado no princípio da coexistência pacífica.
Essa cooperação próxima representa a prática de construir uma comunidade com futuro compartilhado para a humanidade e exemplifica vividamente o apoio mútuo e o desenvolvimento comum entre os países do Sul Global, afirmou Santos.
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