O artigo 19, atualmente em vigor, define que a empresa só pode ser responsabilizada civilmente depois de descumprir decisão judicial para remoção de conteúdo.
Foto: Fellipe Sampaio/STF
O artigo 19, atualmente em vigor, define que a empresa só pode ser responsabilizada civilmente depois de descumprir decisão judicial para remoção de conteúdo.
Ana Pompeu E Renata Galf, Brasília, Df (folhapress) - 18/12/2024 20:00:09 | Foto: Fellipe Sampaio/STF
O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luís Roberto Barroso, defendeu nesta quarta-feira (18) que atual regra sobre responsabilidade das plataformas de rede sociais é apenas parcialmente inconstitucional.
Ele considera que o artigo 19 do Marco Civil da Internet, aprovado em 2014, é insuficiente para o cenário atual, mas defende que ela não seja derrubada, sendo mantida, por exemplo, para casos de ofensas e crimes contra honra.
Com isso, ele abriu divergência na retomada do julgamento dos dois recursos relatados pelos ministros Dias Toffoli e Luiz Fux, que votaram pela inconstitucionalidade completa da regra atual.
Esses duas ações estão sendo analisadas em conjunto, em julgamento que teve início no fim de novembro. Esta é a quinta sessão dedicada ao tema.
O artigo 19, atualmente em vigor, define que a empresa só pode ser responsabilizada civilmente depois de descumprir decisão judicial para remoção de conteúdo.
Assim, alguém que se sinta lesado pode notificar a plataforma e, em caso de negativa, ir à Justiça pedir a derrubada de alguma publicação. Se mesmo com determinação de um juiz a empresa mantiver no ar o post questionado, só aí pode ser punida.
Barroso defendeu que o regime atual é o ideal para muitas situações e não deve ser retirado do ordenamento jurídico, apesar de defender que ele é insuficiente para o cenário atual e considerar que há necessidade de se estabelecer uma regulação.
"A remoção em caso de ofensas e crimes contra a honra não pode prescindir de decisão judicial. Ainda que se alegue que representem crimes de injúria, calunia ou difamação, devem permanecer sob o artigo 19 sob pena de violação da liberdade de expressão. Nós estamos falando da responsabilização da plataforma. Não evidentemente do autor do insulto", disse.
De acordo com ele, o Supremo tem uma tradição de defesa da liberdade de expressão, que deve ser preservada, sendo restringida pela corte apenas em casos de discurso de ódio ou teorias conspiratórias.
Além disso, em lugar de monitoramento ativo com responsabilidade por conteúdo individuais, formato semelhante ao defendido pelo ministro Fux em seu voto, Barroso propões o que chamou de um "dever de cuidado", com responsabilização por falhas sistêmicas.
Outra divergência de Barroso foi quanto à possibilidade responsabilização objetiva das plataformas, ou seja, independentemente de notificação e culpa -como defendeu Toffoli.
Diferentemente dos colegas que já votaram, ele adota uma posição intermediária em relação à possibilidade de punição das empresas por postagens de usuários das redes.
Para o presidente do tribunal, ainda, a manutenção do artigo 19 também exige novos requisitos de controle das redes sociais e da responsabilização das empresas. A internet, segundo ele, permitiu a chegada de qualquer pessoa ao espaço público sem nenhum tipo de controle. "Abriu o espaço no mundo para a desinformação, mentiras deliberadas, discursos de ódio, teorias conspiratórias que fazem a vida ficar pior", disse.
"É preciso enfrentar os comportamentos ilícitos e os perigosos que podem acontecer. É o ponto mais delicado. A regulação de conteúdos e de comportamentos inautênticos coordenados, que às vezes passa abaixo do radar das pessoas, com a utilização de artifícios para amplificar a desinformação, a mentira, usando os bots", disse.
Em contraposição a Toffoli, ele também afirmou que não inclui obrigação adicional para marketplaces, que abrange plataformas como Mercado Livre, Shopee e Amazon.
Toffoli defendeu que elas devem ter responsabilidade, independente de notificação ou decisão judicial, nas hipóteses de produtos de venda proibidas, sem certificação ou homologação pelos órgãos competentes do país.
O Marco Civil da internet é uma lei com direitos e deveres para o uso da internet no país, aprovada em 2014. Ela estabelece direitos e garantias para a vida digital e o uso das redes, buscando proteger a privacidade e os dados de usuários, assegurando a inviolabilidade e o sigilo das comunicações e estabelecendo o direito à cidadania digital.
À época, a regra foi aprovada com a preocupação de assegurar a liberdade de expressão. Uma das justificativas é que as redes seriam estimuladas a remover conteúdos legítimos com o receio de serem responsabilizadas; por outro lado, críticos dizem que a regra desincentiva as empresas a combater conteúdo nocivo.
No Supremo, Barroso pautou o tema, segundo afirmou na primeira sessão sobre o tema, após o Congresso não legislar sobre a matéria.
O ministro Dias Toffoli votou nesta quinta-feira (5) pela tese de que as redes devem ser responsáveis independentemente de decisão judicial para obrigá-las a remover conteúdos.
Para ele, as plataformas devem agir assim que avisadas por alguém que se sentiu ofendido -e, em alguns casos, nem deveria ser necessária notificação, como para perfis falsos e situações de terrorismo.
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