Por Everardo Gueiros: O Brasil é um País de leis ou de desculpas?

O modelo jurídico brasileiro, em vez de garantir previsibilidade e justiça, muitas vezes se transforma em um labirinto de interpretações elásticas, onde a clareza dá lugar à subjetividade e a segurança jurídica se dissolve em manobras processuais e decisões contraditórias

Por Everardo Gueiros: O Brasil é um País de leis ou de desculpas?
Por Everardo Gueiros: O Brasil é um País de leis ou de desculpas?

Por Everardo Gueiros - 12/02/2025 15:41:19 | Foto: Veronoticias.com

O Brasil se orgulha de ser uma democracia com um ordenamento jurídico robusto, extenso e meticulosamente detalhado. Somos uma nação que acredita na força da lei e na solidez das instituições. No entanto, a realidade que se impõe diariamente nos tribunais, nos corredores da burocracia e nas manchetes dos jornais revela um paradoxo inquietante: ao mesmo tempo em que criamos leis para tudo, nos especializamos em encontrar desculpas para que muitas delas não sejam cumpridas.

O problema não está no texto das normas, mas na forma como elas são aplicadas – ou melhor, na forma como elas são relativizadas. O modelo jurídico brasileiro, em vez de garantir previsibilidade e justiça, muitas vezes se transforma em um labirinto de interpretações elásticas, onde a clareza dá lugar à subjetividade e a segurança jurídica se dissolve em manobras processuais e decisões contraditórias.

Essa distorção fica evidente na aplicação da legislação penal. Enquanto as leis preveem punições proporcionais aos crimes, a realidade nos mostra um sistema onde os processos se arrastam por anos, os recursos são usados como estratégia de postergação e as penas, quando aplicadas, muitas vezes se esvaziam em progressões automáticas ou benefícios descolados do senso comum de justiça. Isso não significa que devemos retroceder a um punitivismo cego, mas sim que precisamos de um modelo que respeite a isonomia e a razoabilidade, sem que a impunidade se torne a regra.

No campo econômico, a situação não é diferente. O Brasil é um dos países com a legislação tributária mais complexa do mundo, gerando insegurança para empreendedores e investidores. Ao mesmo tempo, governos sucessivos criam programas de refinanciamento para aqueles que não pagaram seus tributos em dia, penalizando quem cumpre suas obrigações. O resultado é um ciclo vicioso onde a credibilidade do sistema se fragiliza e o custo do Estado ineficiente recai sobre aqueles que produzem.

O Poder Legislativo, por sua vez, não fica atrás. A cada novo problema social ou político, a resposta mais comum é a criação de novas leis, como se o excesso normativo fosse sinônimo de solução. No entanto, sem um compromisso real com a aplicação equitativa dessas regras, de que adianta ampliar o arcabouço legal? Em vez de remendar o ordenamento jurídico com respostas casuísticas, seria mais prudente reforçar a cultura da previsibilidade e da coerência.

É nesse ponto que entra o verdadeiro conservadorismo jurídico: um compromisso com a estabilidade das normas e com a segurança jurídica. A lei deve ser um instrumento de justiça, e não uma ferramenta de conveniência, aplicada com rigor seletivo. Se há algo que precisa ser modernizado, não é a legislação em si, mas sim o modo como a interpretamos e a utilizamos.

O Brasil precisa decidir se quer ser um país onde a lei é cumprida com seriedade e igualdade, ou se continuará sendo um ambiente onde as desculpas e as interpretações convenientes enfraquecem a confiança no próprio sistema. O caminho para uma nação mais justa não está na multiplicação infinita de normas, mas na reafirmação do princípio fundamental de que a lei é para todos.

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